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Um dia, sem se saber muito bem porquê, tudo aconteceu de repente: as palavras cor-de-rosa desapareceram do planeta. O que são palavras cor-de-rosa? São palavras delicadas, como “obrigado”, “por favor”, “se não se importa”, é tão importante para mim”. Palavras tão doces que são como mel no coração. Seria obra do Mago Cinzento, que só gostava do salgado, do picante e do amargo? Não… eram os homens que, vá lá saber-se porquê, preferiam as palavras picantes, amar-gas e salgadas.

Naquela época, existiam na Terra lojas de palavras cor-de-rosa, vendiam “te amo”, “penso em voce”, “muito obrigado”, … Os vendedores de palavras cinzentas vendiam sobretudo “não enche o saco”, “cala a boca”, …

A principio, comprava-se muiuto mais palavras cor-de-rosa do que palavras cinzentas. os vendedores de palavras cor-de-rosa faziam bons negócios, e um perfume doce envolvia a Terra. Os vendedores de palavras cinzentas passavam os dias à espera, proque só tinham clientes uma ou duas vezes por ano. No entanto, um dia, os homens puseram-se estranhamente a comprar palavras cinzentas. Havia uma crise de emprego, uma greve de corações. Os patrões compravam muitos “vá pregar em outra freguesia”, “está bem arranjado”, “obrigado por seus serviço mas está despedido”.

Havia guerra entre famílias, divórcios, casais que já não se entendiam, Invejas entre irmãos, brigas… Comprava-se vários “já não gosto de voce”, “acabou tudo”. Nas lojas de palavras cor-de-rosa muitos “obrigado”, “por favor”, “gosto de voce”, fica-vam sem vender.

– Para o diabo com as palavras doces – diziam os homens. – São caras e não trazem nenhum benefício.

Os vendedores de palavras cor-de-rosa fechavam umas atrás de outas. “Passa-se o ponto”, “Fechado por morte do proprietário”, “Liquidação total”, “15 palavras cor-de-rosa pelo preço de 1”. Mas, mesmo a preços módicos, elas não atraíam ninguém.

As lojas de palavras cinzentas, essas sim, prosperavam. Por que, e isso é bem conhecido, as palavras feias são contagiosas. Até nas escolas as palavras cinzentas prosperava, “se no recreio voce se lembrar de falar uma palavra cinzenta, receberá dez em troca! Abriram-se mesmo lojas especializadas em palavras feias, risos grosseiros, insultos horríveis. E os vendedores cinzentos trabalhavam dia e noite para descobrirem joias raras, as palavras mais horríveis e mais maldosas!

Como receavam ficar sem provisões, como costuma acontecer em tempo de guerra, as pessoas começaram a fazer conservas de palavras cinzentas. Congelaram um monte delas e as empilhavam nos armários da cozinha, debaixo das camas, guarda-roupas,…. E ao menos atrito, ao mais pequeno gracejo, à mais insignificante discussão, ia no estoque e pegava “cala a boca”, “voce é um atraso de vida”, “idiota”, … e assim por diante!

Os aniversários tinham lugar no meio dos piores insultos. Cantarolavam “infeliz aniversário” e soltando uma bomba de palavras feias no meio da festa. Entre os adultos, para festejar a virada do ano, comiam passas e bebiam suco de uvas pretas, no meio de palavras como:

– Desejo um ano péssimo e, principalmente, muito pouca saíde!

Antes das aulas, as crianças corriam para as lojas cinzentas e enchiam os bolsos de palavras feias para a hora do recreio. Antes das férias, os adultos também as lojas para encgerem as malas de palavras cinzentas, de piadas estúpidas, que atiravam pela janela nas ruas, durantes os engarrafamentos.

À face da terra, a atmosfera era glacial. O sol, que tem medo das grosserias, recusava-se a brilhar. Lembrava-se de outros tempos, em que era acolhido de braços abertos:

– Que dia lindo! Que maravilha! Obrigado Sol…. Meu Deus como eu gosto do Sol…

Em vez disso, agora se ouvia:

– Que calor horrível Kêkalôr!

Então as nuvens invadiram o céu, e a Terra mergulhou num período gracial. Toda a gente tinha frio.

A Terra estava tão triste, sem flores nem pavras cor-de-rosa! No entanto, um menino não queria se habituar às palavras cinzentas. Talvez por, no seu bolso, ter ficado uma palavra cor-de-rosa meio gelada. “Eu, dizia Pedro, não quero um mundo onde mais ninguém canta, onde não se diz bom dia, nem obrigado, onde hea sempre tanto feio. Vou ver se encontro o Sol.

O menino caminhou durante muito tempo, escalou colinas geladas, pequenas e grandes montanhas, vulcões extintos. Por fim, ao cabo de meses e meses de árdua caminhada, chegou exausto à casa das nuvens.

– Toc, toc – bateu – Venho a procura do Sol.

– Oh, oh! – exclamou a nuvem-chefe, que tinha tomado posse do céu cinzento. – Olhem só para isto… um fedelho redículo vem a procura do Sol! O Sol não aparece a ninguém! Desde que as palavras cinzentas tomaram o poder, somos nós, as nuvens cinzas, que somos os chefes.

Dito isto, virou as costas e fechou a porta na cara do menino. O menino se sentou confuso, Como responder? Não trazia no bolso uma única palavra cinzenta. Então, começou a chorar. A nuvem olhou para ele surpreendida: já a muito tempo que não via ninguém chorar! Naquele universo glacial, todos os olhos estavam gelados, todos os corações estavam frios.

– Para com isso imediatamente! – gemeu a nuvem. – Senão vou fazer cair um aguaceiro.

Finalmente comovida decidiu ajuda-lo.

– Olha, aquela bolinha a,arela ali embaixo é o Sol.

Pedro abriu os olhos e viu de fato uma bola de bilhar perdida na imensidão do azul: era o Sol, que estava desaparecendo por causa dos maus-tratos. Já no limite das forças, o menino caminhou em direção da pequena bola amarela.

– Bom dia! disse o menino. – Vim te buscar. Tudo se tornou cinza na Terra. temos frio, sentimos-nos mal. Nunca rimos, nunca dizemos palavras delicadas. Voce pre-cisa voltar.

E o sol e o menino começaram ambos a suspirar, pensando naquela “época cor-de-rosa”.

– Precisa voltar – insistiu Pedro.

– Vou, como experiência – resmungou o Sol. – Mas joga primeiro para a Terra estas palavras cor-de-rosa. Assim a minha volta será mais agradável.

O Sol deu ao menino um conjunto de palavras cor-de-rosa: “por favor”, “muito obroado”, “gosto de voce”, “ amor da minha vida”, “se não se importa”, etc.

O menino meteu as palavras no bolso, na boca, no boné, nas meias, em todo lado. Tudo que conseguisse levar. regressou à Terra e distribuiu as palavras ao acaso. De repente, nos engarrafamentos, as pessoas começaram a desdobrar os papelzinhos cor-de-rosa: “que tempo bonito não acha”, “pode ir na frente, não tenho pressa”….

Nos recreios, começaram a ouvir novamente risos simpeaticos e palavras como “voce é meu melhor amigo”, “claro que pode jogar”…. Em casa, as crianças voltaram a usar palavras cor-de-rosa: “obrigado mãe”, “por favor”, “desculpa”, “não fiz de propósito”… Nos aniversários se cantava alegremente e nas festas de fim de ano davam-se votos de saude e felicidade.

O Sol voltou a brilhar e a deitar-se todas as noites na sua nuvem cor-de-rosa. E, juro, os vendedores de palavras cor-de-rosa começaram a fazer fortuna! Abriu-se lojas especializadas em sorrisos, em suspiro de satisfaçano, de delicadeza, de cortesia, de civismo…. Foi como mel no coração.

Quanto as palavras cinzentas, decidiram, diante de tanta felicidade, se esconder. E quando alguma se lembrava de vir meter o nariz, eu te garanto que não ficavam por muito tempo.

Fonte: Sophie Carquain, livro” Petites histoires pour devenir grand”. Ilustração Rita da Fonseca.

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