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Pedro era um rapazinho “quase” como os outros…, com a diferença de que nunca parava de fazer perguntas. Pequenino, ainda antes de saber falar, apontava para uma coisa com as interrogativo e, se a resposta tardava, punha-se a berrar e ficava muito vermelho. “Por que é que os coelhos não gostam de chocolate? E por que é que o açúcar é doce?”

Os pais olhavam para o céu à procura de solução, mas não caía nenhuma resposta das alturas…

Quanto mais o Pedro crescia, mais eles coçavam a cabeça, porque, com a idade, as questões tornam-se cada vez mais complicadas.

Eram perguntas que exigiam um pouco mais de tempo, e quando os pais estão ocupados a mudar um pneu do carro ou a fazer o jantar, é-lhes difícil responderem.

Quando fazia certas perguntas (sobre os bebês por exemplo) a mãe abanava a cabeça e respondia:

– Hum… É uma pergunta muito delicada, meu filho. Dá-lhe tempo para pensar.

Há uma idade em que, à força de se fazer muitas perguntas e de não se obter respostas, se acaba por desistir. Foi por isso que, no dia em que Pedro encontrou o seu coelho branco morto na gaiola, não fez qualquer pergunta à mãe, com receio de a embaraçar. “Com certeza”, pensava ele, “certas palavras como morte, doença, fazer bebês, são palavrões.”

Então, o rapazinho enterrou o coelho em silêncio e, com ele, a sua pergunta. Refugiou-se no jardim, e refletiu na vida, e tudo aquilo gerou uma pequena nuvem negra que lhe dava voltas dentro da cabeça.

Ficou triste. Não sabia que àquilo se chamava “solidão”.

Um dia, estava Pedro refugiado na tenda, quando ouviu uma voz muito meiga. Viu então uma senhora de olhos profundos e escuros que o observava a sorrir.

– Bom dia, Pedro – disse-lhe a senhora. – Sabe quem sou? Sou a Dama das Histórias.

– A Dama das Histórias?!

– Sim! A Dama das Histórias. Venho visitar os meninos como você, que têm uma nuvem negra no coração. Venho dizer-lhes que nos livros há histórias que podem dar-lhes respostas.

– Respostas a todas as minhas perguntas? – perguntou Pedro arregalando os olhos.

– Não vai encontrar forçosamente todas as respostas, mas sim todas as suas perguntas. Verá, ao ler, que outros fazem as mesmas perguntas que você. É por isso que os livros são feitos para as crianças curiosas, para aquelas que têm milhares de perguntas e que, além disso, querem viver várias vidas… Podem ser, ao mesmo tempo, Cinderela, Robin Wood ou Peter Pan, sem precisarem de qualquer requisito especial! E o mais maravilhoso é que, nos livros, cada um aprende a a fazer muitas coisas que não conheciam! Apenas com algumas palavras, papel e muita imaginação…

A Dama das Histórias entregou um livro ao Pedro, livro esse que ele agarrou com avidez. À medida que lia, a pequena nuvem negra ia desaparecendo e Pedro sentia-se tão aliviado que teve vontade de cantar.

Enquanto o folheava, Pedro tinha a impressão que ouvia os murmúrios dos gnomos que, com ele, viravam as páginas. Na realidade, ele já não se encontrava no jardim. Tanto podia estar num avião, num barco, como num castelo com o rei Artur.

E tudo isto ao mesmo tempo! Sentia coisas que nunca antes tinha vivido: o gosto do mar nos lábios, o sabor de um boblo de limão, o coração que pula no peito quando se está apaixonado, ele que era tão tímido com as meninas…

Levantou os olhos do livro para perguntar à Dama das Histórias como é que simples páginas, tinta e papel, podiam produzir um efeito daquele, mas a Dama das Histórias já tinha desaparecido. Ao longe, ouviu sua voz doce dizer-lhe:

– Pedro, hei de voltar. Existem milhões de livros!

A nuvem escura das perguntas condensadas tinha desaparecido. No seu lugar, havia uma nuvem transparente, cheia de desejo de ler os milhões de livros do mundo inteiro.

E, a partir desse dia, Pedro nunca mais se sentiu oprimido pelas perguntas.

Quando começava a ter frio, a sentir-se só e tristonho, pegava num livro e a magia recomeçava…

Sophie Carquain
Petites histoires pour devenir grand Paris,
Ed. Albin Michel, 2003

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